Por Joe Cruz
Há
muito não chovia... Durante quase três meses, o sol pareceu não
ter a mínima vontade de nos fazer sentir a sua falta: clareando o
dia, brilhando forte, cheio de vida e calor; o céu limpo e azul
parecia hostilizar o passeio das nuvens. Sopros quentes de ventos
vespertinos, agitavam os finais das tardes. À noite, a lua enchia-se
com sua vaidade feminina, não permitindo que a escuridão ofuscasse
suas formas perfeitas. Até o tempo parecia deslizar numa euforia
juvenil, correndo rápido, atropelando horas, minutos e segundos,
esgotando-se em seu próprio deleite.
Períodos
assim, favorecem maior percepção das cores, dos sons, das
paisagens, das esperanças... Pessoas se dizem mais alegres,
dispostas e entusiasmadas em tempos assim; algumas até sente-se mais
bonitas e desejadas!
Acontece
que isso passa. As chuvas voltam e alteram a paisagem com nuvens
lentas e pesadas, ventos frios e silenciosos. As cores, outrora
vivas, se deixam tomar pela tonalidade acinzentada de caráter
melancólico que transforma o dia num combinado estranho de beleza e
escuridão. Dias assim instigam o silêncio e, portanto, a
sensibilidade do olhar.
Reparando
com certo cuidado, é possível perceber alguma semelhança entre o
humor dos dias e nosso estado de espírito. Às vezes estamos
“Tempestade”, enraivecidos entre estouros de
trovões e lampejos de relâmpagos. Outras, estamos “Frios e
Nublados”, indiferentes à dor alheia. Muitas vezes estamos
“Ensolarados”, irradiantes e agradáveis para o mundo
todo. Quando estamos “Ventania”, somos música delicada a
flutuar no ar.
Para
além das analogias, sinto realmente que exista alguma influência do
caráter do dia no conteúdo do que pensamos e sentimos. Numa das
semanas da primavera deste ano, tivemos o privilégio de dias
melancolicamente inspiradores. Choveu fraco e fez frio. Manhãs
escuras, silenciosas e lentas. Neste “clima”, o corpo se
contrai e a alma se expande, os ouvidos pedem músicas menos agitadas
e mais intensas. Assim compõe-se o cenário propício para o
aprofundamento de reflexões que normalmente não fazemos; para o
resgate de sentimentos esquecidos no baú das memórias ou para a
elevação da concentração sobre o agora. Este silêncio nublado,
favorece o olhar para o interior de si e o esforço para a
compreensão do outro.
Dias
de sol e céu aberto são maravilhosos e nos distrai com sua beleza e
energia. Dias nublados se mostram pouco para que possamos nos
enxergar melhor, pois como diz Rubem Alves: É preciso desencaixotar
emoções e recuperar sentidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário