Uma pausa para um cafezinho! Uma conversa à toa para desbanalizar o dia a dia... Um espaço e um momento solto no ar, preso no olhar inutilmente essencial.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

1,2,3 e... Já!(neiro)


Por Joe Cruz

Chegamos enfim à primeira metade do primeiro mês do novo ano. A euforia supérflua dos últimos dias do final do ano passado já perdeu seu gás até para os mais resistentes dos eufóricos. O cotidiano maçante e repetitivo volta ao seu lugar de destaque na vida da maioria das pessoas. E o que começa a ganhar forma é a mesma e conhecida paisagem de dias que se esvaem incessantemente; folhas de calendários que voam para o passado, amontoando-se novamente na linha do tempo.

Tal normalidade, não é de se espantar, já começa a pôr em xeque algumas das promessas feitas naqueles momentos de euforia.

É compreensível algum devaneio nos finais de anos. Afinal, pausados das rotinas de trabalho, embevecidos pelas luzes coloridas de natal, esmagados por abraços coletivos de familiares e amigos bêbados, é natural encorajar-se para almejar viver um novo ano dominados pela força do “mais”: ler mais, amar mais, viajar mais, perdoar mais, exercitar-se mais, arriscar mais... mais e mais! Mas aí começa o ano de verdade e esculhamba tudo! Fica tudo abstrato demais.


Olhando deste ponto, aquele otimismo inebriante e quase supersticioso de outrora não resiste por muito tempo. Aqui é inevitável certo tom de desilusão, o que não é tão ruim assim, pois desiludir-se nada mais é do que abandonar ou ser abandonado por alguma ilusão. Qualquer dicionário vai definir ilusão como engano dos sentidos, erro de percepção, enfim, desiludir-se deveria ser algo positivo!

De qualquer maneira, independentemente de quantas ou quais metas pessoais foram estipuladas para o novo ano, o que as pessoas esperam conseguir é ser mais felizes do que no ano anterior, ou pelo menos manter o nível das felicidades que conquistaram. A grande promessa, portanto é ser feliz.

O problema é que cumprir uma promessa dessas não é fácil e certamente depende muito mais de si próprio do que de qualquer interferência externa que se possa acusar no caso de fracasso. Aliás, é a iminente possibilidade de fracassar que parece ter se tornado o pano de fundo da nossa maneira de atuar neste teatro improvisado da busca pela felicidade. Um dia após o outro, uma nova meta a cada meta alcançada, um novo futuro no lugar daquele que já não se vislumbra mais... Se não dá pra ser feliz assim, que seja assado. E se não der de jeito nenhum, que se invente um jeito! O importante é que se cumpra a promessa. A obrigação de estar (ou parecer) feliz o tempo todo dá o tom dos dias atuais. E desconfio que não seja de hoje.

Nada contra gente que tenta parecer feliz o tempo todo, mas prefiro gente de verdade. Gente que sabe o que faz e por que faz. Gente que busca compreender suas ações e experiências diárias como o único meio de produzir sentido em sua relação consigo e com o mundo. Gente que procura estabelecer a coerência necessária entre as consequências de suas escolhas e a motivação de seus atos decididos por si mesmo, não pela moda, propaganda, gurus e afins... Gente que pensa por si mesmo e assume os riscos de tal ousadia.
Quem procura fazer sentido em tudo que faz, sabe que é impossível parecer feliz o tempo todo, justamente porque entende que a beleza da vida está na verdade daquilo que sente genuinamente.

O raciocínio parece simples: pessoas sentem-se mais satisfeitas com a vida quando fazem aquilo que tem vontade de fazer. Ainda mais quando para tanto não encontram restrições de nenhuma ordem que as impeçam de realizar tal proeza.
Vontade, habilidade e liberdade de ação, estão aí os elementos básicos para a realização daquilo que essencialmente é capaz de fornecer satisfação em viver. Acontece que sozinhos não passam de alimentos crus sem cheiro, cor nem sabor. O tempero especial para esses elementos é o que se pode chamar de “motivo”.

Ora, motivo nada mais é que a razão de ser. É a alma da vontade. Encontrar os próprios motivos para realizar aquilo que se deseja, sem dúvidas é o que oferece sentido as nossas ações. O grande problema nisso tudo é que para identificar em si mesmo motivos para realizar algo, vai depender também de algum conhecimento de si. E é aqui onde as coisas se embaralham. Parece que não há mais tempo dentro de um ano para conhecer a nós mesmos. E ficamos assim, criando desejos e tentando satisfazê-los.  


Supomos conhecer nossas vontades, mas temos dificuldades em compreender suas origens. Ainda mais hoje, com a facilidade e hábito que adquirimos de observar modelos de todo tipo de vidas na internet (facebook), televisão, cinema, etc... Já não se pode ter certeza se o que queremos é fruto de nossa essência em conformidade com nossa personalidade ou apenas desejos vazios motivados por alguma influência de modelos de felicidade e sucesso.


De todo modo, a largada já foi dada. Cruzar a linha de chegada ainda levará onze meses e meio. Temos tempo para nos adaptar à corrida, pular obstáculos, cair, levantar, recuar, avançar, criar estratégias de ultrapassagens... No entanto, não há melhor momento que este para conhecermos o próprio corpo e reconhecer nele seus limites naturais. Somente assim será possível poupar o fôlego necessário para terminar a corrida, mesmo  que, como diria Cazuza,“sem pódio de chegada ou beijo de namorada”.


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