Por Joe Cruz
Em
uma de suas belas canções, Renato Russo aponta para uma questão
importante para nosso tempo que é, afinal de contas, “Hoje
em dia como é que se diz 'Eu te Amo'?”.
O trecho pertence ao refrão da
canção “Vamos fazer um filme” que
fala também em solidão, amor de verdade, liberdade para amar, etc e
tal. Mas o que interessa aqui é procurar entender se de fato já
não sabemos confessar sentir
amor por alguém. Ou ainda pior, se somos mesmo capazes de
identificar este sentimento dentre tantos
outros.
Diante
da presença de alguém que além
de despertar desejo sexual, tenha
sido capaz de nos oferecer
aconchego, segurança e atenção, cujo
o simples toque, o olhar, o
som da voz parece ter o poder
de nos desorientar; ao
lado de alguém que parece fazer a
vida acontecer cheia
de cores e sentidos,
é provável que muitos de nós tenha sentido a
vontade quase irresistível de gritar com
toda força dos pulmões: - Eu
te amo! Mas
como garantir que a sensação não seja apenas um reboliço
passageiro, um devaneio
causado pela carência, um
prazeroso e inocente engano?
O
escritor Oscar Wilde apimenta
a questão afirmando que “Amor é quando
começamos por enganar a nós próprios e acabamos por enganar a
outra pessoa”. O engano a que
se refere Wilde,
certamente é induzido pela vontade de amar e
ser amado.
Há
algo em nós que almeja o ápice dos sentimentos e
buscamos nele os limites da
razão e a intensificação desejos. Não
há dúvidas de que tão ambiciosa busca, carrega em si um
grande risco para amantes
aspirantes: a desilusão.
Amor
e sofrimento parecem andar juntos. Sofre-se por não conquistar o
amor, sofre-se pelo medo de perder amor, sofre-se por já tê-lo
perdido, sofre-se por não saber amar... O Jovem Werther de
Goethe, bem sabe dos sofrimentos causados por sua alucinada
paixão pela bela Charlotte. Aliás, este é sem dúvidas um
excelente exemplo do amor idealizado, que cria novas expectativas a
cada suspiro, que se alimenta de ilusões e definha em sua própria
impossibilidade.
Talvez
julguemos insanos aqueles que pautam seus planos de vida e suas
esperanças de felicidade num sonho de amor pleno e verdadeiro,
justamente pelo fato de que isso dependerá de outra pessoa. Pautar o
próprio destino alinhando-o à crença no amor alheio, é atirar-se
num abismo esperando que travesseiros de plumas amorteçam a queda.
Acontece que eles podem não estar lá. E neste caso é bom que se
tenha criado asas!
O
curioso é que ainda assim nos dispomos à utopia do amor-perfeito.
Há ainda os que são loucos para jurar amor até que a morte os
separe (seja lá o que isso queira dizer) e acreditam na
capacidade de passar o resto da vida amando a mesma pessoa. O
problema é que definitivamente não vivemos em campo propício para
isso e uma das razões é frouxidão dos laços que atualmente somos
capazes. É provável que a maioria de nós reconheça o risco de
permitir que uma paixão se transforme em amor. E talvez por isso
somos uma geração que morre de medo do envolvimento, nos limitando
a relações superficiais, qualificadas pela quantidade de prazeres
obtidos delas.
Grosso
modo, poderíamos dizer que a dificuldade da intensificação nos
relacionamentos deve-se a velocidade dos acontecimentos da sociedade
moderna, e nós no meio do furacão, não temos “saco”
para algo que demanda tanto tempo, dedicação e atenção.
Pressionados pelo sucesso, obcecados pelo futuro perfeito, não
conseguimos parar para reparar em nossa delicada condição.
Nunca
tivemos tanto receio da aproximação afetiva, nossas relações são
cada vez mais plásticas e dependentes de ferramentas virtuais como
Chats, e-mails, Redes Sociais e aplicativos
para celulares. Nossa devoção por coisas parece
suplantar nossa necessidade da entrega ao contato humano, e nossa
tendência à inversões nos submete a coisificação de
pessoas e a humanização de animais. Tornamos mercadoria tudo
aquilo que supomos ter algum valor: vendemos ética, negociamos
amizades, trocamos moral, e ao mínimo sinal de insatisfação,
descartamos pessoas...
Engraçado
é que banalizamos o amor ao mesmo tempo em que o desconhecemos.
Muito já se falou sobre o amor, muitas histórias foram escritas,
músicas foram compostas em sua homenagem, calhamaços teóricos
foram pensados, até a ciência meteu o bedelho na tentativa de
racionalizá-lo. No entanto, continuamos seus súditos, à mercê de
seus caprichos, vítimas de sua loucura... Talvez hoje, estejamos
menos preparados e mais medrosos para encará-lo do que em qualquer
outra época. E, ao que parece, a vontade de dizer “Eu te amo”,
para a grande maioria, ficará por algum tempo sufocada na incerteza
da possibilidade de realmente senti-lo.
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