Uma pausa para um cafezinho! Uma conversa à toa para desbanalizar o dia a dia... Um espaço e um momento solto no ar, preso no olhar inutilmente essencial.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Entre Blogs e Garagens – A experiência do “Faça você mesmo”.

Entre Blogs e Garagens – A experiência do “Faça você mesmo”.
Por Joe Cruz
Engraçado!
Quando entro em contato com determinados textos, logo imagino como eu os escreveria mesmo não sendo um escritor. Impulsiono-me a escrever simultaneamente à leitura... é mesmo engraçado. Provavelmente a liberdade experimentada por uma leitura entusiasmante e esclarecedora, faz com que o universo das palavras esteja sujeito a uma exploração imediatamente possível.

Acredito que tenha sido por uma sensação parecida que o Punk inglês se propagou tão rápida e sinceramente pelo mundo. Digo do Punk aqui não como ideologia etc e tal, mas sim pelo ponto de vista musical, isto é, a música simples e direta, forte e provocativa que ofereceu aos jovens a possibilidade de fazer aquilo que admiravam e da maneira que lhes cabia. Esta ambição (ou a falta dela) trouxe à expressão musical, mais precisamente no cenário do rock produzido a partir da segunda metade dos anos 70, tal energia capaz de “torrar um cérebro”, transformando corpo e mente em dignos condutores de pura energia juvenil, carregada de críticas a sociedade, revolta e a perigosa sedução à liberdade.
O “faça você mesmo” sugerido pela música Punk, não caracteriza o padrão de uma música fácil que pode ser produzida aquém de uma base ideológica ou não fundamentada em questões subjetivas relevantes. Ao contrário, esta é justamente a roupa indispensável que veste os acordes sujos, sequenciados, rasgados como as calças Jeans, com base no compasso quatro por quatro herdado do autêntico Rock n Roll americano do início da década de cinquenta.

Num cenário, mesmo o do Rock, onde o pano de fundo para uma razoável atuação musical era ser capaz de compreender as variações comuns ao Jazz ou pelo menos conhecer as escalas que caracterizam o Blues, é possível conceber a importância de uma ruptura como a inferida pelo Punk Rock. 

Naturalmente, devido à rápida expansão do gênero, nem sempre os frutos gerados pelas ramificações do estilo foram tão proveitosos, no entanto o legado deixado pelo Punk às gerações seguidas é indiscutivelmente responsável pelas garagens sonoras espalhadas pelas décadas de oitenta e noventa.
Obviamente há os que consideram esta “democratização” musical um grande desserviço no que diz respeito à qualidade, tanto da música quanto na forma com a qual os Punks se fizeram notar socialmente no engajamento contra os modelos sociais. Isso é outro assunto e seria necessário explorar conceitos como: qualidade na música, liberdade de criação, sociedade, cultura... enfim, complexidade desnecessária para o que pretende este texto.


De maneira análoga, atualmente, com toda a exposição e liberdade de escrita dos que se propõem a esta nobre atividade, seja o profissional - aquele que é remunerado para exercer a função - ou o amador que geralmente é reconhecido nos textos na internet, a democratização na escrita também é vista com olhos desconfiados. A popularidade dos blogs certamente tem alguma coisa com isso. 


Assim como na música, há também no campo das palavras o deslumbre do “faça você mesmo!” e sem dúvidas a possibilidade ou melhor, a facilidade de manter um blog na internet, escrevendo o que vier na telha, sem que seja necessário seguir determinado critério, é o que caracteriza este espaço como um ambiente para todos.

Ora, é comum considerarmos que se algo é feito para todos, podemos considerar que também é dado a qualquer um. E se algo pode ser feito por qualquer um, então não tem valor. Fácil, porém falso. Obviamente no imenso calhamaço da “palavra solta” dos blogs na internet, há o que se admirar, informar, emocionar e detestar.
É justamente pela ausência do compromisso com o critério, que a forma livre da escrita em blogs é validada e submetida aos gostos, interesses, sensibilidades, insanidades, particularidades. Num blog, o que dita a energia do pensamento é a vontade de quem o conduz. Neste sentido, talvez seja possível dizer que para o texto livre, o blog seja a “garagem” donde o Punk e suas ramificações se exercita e se afirma, primeiro como possibilidade, depois como potência.

Nas artes a liberdade de fazer apresenta-se como algo anterior à técnica que se pretende aplicar. Antes mesmo da preocupação em “como fazer” é necessário, acredito, entender o “por que fazer?”. É preciso tocar a intenção com as pontas dos dedos e da língua, tatear, procurar sentir o gosto. É preciso ser tomado, fazer parte. Muitas vezes, essa consciência passa primeiro pela contemplação de uma produção externa, donde vai se originar a possibilidade. Eis o ponto de partida.


Experimentar a sensação da possibilidade de exploração no universo das artes é, antes de tudo, a experiência de uma forma de redenção diante do impacto das emoções, sejam elas quais forem. E a necessidade de fazer parte, não é senão a habilitação para adentrar neste universo.

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