Entre
Blogs e Garagens – A experiência do “Faça você mesmo”.
Por Joe Cruz
Engraçado!
Quando
entro em contato com determinados textos, logo imagino como eu os
escreveria mesmo não sendo um escritor. Impulsiono-me a escrever
simultaneamente à leitura... é mesmo engraçado. Provavelmente a
liberdade experimentada por uma leitura entusiasmante e
esclarecedora, faz com que o universo das palavras esteja sujeito a
uma exploração imediatamente possível.
Acredito
que tenha sido por uma sensação parecida que o Punk inglês
se propagou tão rápida e sinceramente pelo mundo. Digo do Punk aqui
não como ideologia etc e tal, mas sim pelo ponto de vista musical,
isto é, a música simples e direta, forte e provocativa que ofereceu
aos jovens a possibilidade de fazer aquilo que admiravam e da
maneira que lhes cabia. Esta ambição (ou a falta dela) trouxe à
expressão musical, mais precisamente no cenário do rock produzido a
partir da segunda metade dos anos 70, tal energia capaz de “torrar
um cérebro”, transformando corpo e mente em dignos condutores
de pura energia juvenil, carregada de críticas a sociedade, revolta
e a perigosa sedução à liberdade.
O
“faça você mesmo” sugerido
pela música Punk, não caracteriza o padrão de uma música fácil
que pode ser produzida aquém de
uma base ideológica ou não fundamentada em questões subjetivas
relevantes. Ao
contrário, esta é justamente a roupa
indispensável que veste os acordes sujos, sequenciados,
rasgados como as calças
Jeans, com base no
compasso quatro por quatro herdado do autêntico Rock n Roll
americano do início da década de cinquenta.
Num
cenário, mesmo o
do Rock, onde o pano de fundo
para uma razoável
atuação musical era
ser capaz de compreender as
variações comuns ao Jazz ou pelo menos conhecer as escalas que
caracterizam o Blues, é possível conceber a importância de uma
ruptura como a inferida pelo Punk Rock.
Naturalmente,
devido à rápida expansão do gênero, nem sempre os frutos gerados
pelas ramificações do estilo foram tão proveitosos, no entanto o
legado deixado pelo Punk às gerações seguidas é indiscutivelmente
responsável pelas garagens sonoras espalhadas
pelas décadas de oitenta e noventa.
Obviamente
há os que consideram esta
“democratização” musical
um grande
desserviço no que diz respeito à qualidade, tanto da música quanto
na forma com a qual os Punks se fizeram notar socialmente no
engajamento contra os modelos
sociais. Isso é outro
assunto e seria necessário explorar conceitos
como: qualidade na música,
liberdade de criação, sociedade, cultura...
enfim, complexidade desnecessária para o que pretende este texto.
De
maneira análoga, atualmente, com toda a exposição e liberdade de
escrita dos que se propõem a esta nobre atividade, seja o
profissional - aquele que é remunerado para exercer a função - ou
o amador que geralmente é reconhecido nos textos na internet, a
democratização na escrita também é vista com olhos desconfiados.
A popularidade dos blogs certamente tem alguma coisa com isso.
Assim
como na música, há também no campo das palavras o
deslumbre do “faça você mesmo!” e sem dúvidas a
possibilidade ou melhor, a facilidade de manter um blog na internet,
escrevendo o que vier na telha, sem que seja necessário seguir
determinado critério, é o que caracteriza este espaço como um
ambiente para todos.
Ora,
é comum considerarmos que se algo é feito para todos, podemos
considerar que também é dado a qualquer um. E se algo pode ser
feito por qualquer um, então não tem valor. Fácil, porém falso.
Obviamente no imenso calhamaço da “palavra solta” dos
blogs na internet, há o que se admirar, informar, emocionar e
detestar.
É
justamente pela ausência do compromisso com o critério, que a forma
livre da escrita em blogs é validada e submetida aos gostos,
interesses, sensibilidades, insanidades, particularidades. Num blog,
o que dita a energia do pensamento é a vontade de quem o conduz.
Neste sentido, talvez seja possível dizer que para o texto livre, o
blog seja a “garagem” donde o Punk e suas
ramificações se exercita e se afirma, primeiro como
possibilidade, depois como potência.
Nas
artes a liberdade de fazer apresenta-se como algo anterior à
técnica que se pretende aplicar. Antes mesmo da preocupação em
“como fazer” é necessário, acredito, entender o “por
que fazer?”. É preciso tocar a intenção com as pontas dos
dedos e da língua, tatear, procurar sentir o gosto. É preciso ser
tomado, fazer parte. Muitas vezes, essa consciência passa primeiro
pela contemplação de uma produção externa, donde vai se originar
a possibilidade. Eis o ponto de partida.
Experimentar
a sensação da possibilidade de exploração no universo das artes
é, antes de tudo, a experiência de uma forma de redenção diante
do impacto das emoções, sejam elas quais forem. E a necessidade de
fazer parte, não é senão a habilitação para adentrar neste
universo.
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